O MMA sempre nos apresenta grandes personagens com histórias de resiliência e superação. Aletas que moram em comunidade carente costumam dividir seus dias entre treinos e o trabalho, e muitas vezes precisam cuidar da família e de filhos pequenos. Essa realidade faz parte da rotina de Marcos Paulo “Vuvuzela”, nova joia da equipe Brazilian Top Team (BTT) que dá os seus primeiros passos no MMA. Morador da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, o jovem de apenas 25 anos faz bico de mototaxista na comunidade, dá aulas de Muay Thai e ainda encontra tempo para treinar e cuidar da esposa e da filha pequena. Todo esse esforço tem valido a pena. Na última sexta-feira (23), pelo Shooto Brasil 94, ele fez a sua terceira luta de MMA e se manteve invicto ao finalizar Romario Garcia com uma guilhotina ainda no primeiro round.
“Meus horários são super complexos, mas eu penso que, se não houver sacrifício, não haverá vitória. Eu trabalho como professor de Muay Thai e, nas horas vagas entre as aulas que dou e os treinos, faço um bico como mototáxi na minha comunidade para ter um complemento extra na minha renda. Além disso, ainda separo um tempinho para a minha filha e para a minha esposa. Diante de tudo isso, acho que a minha atuação no Shooto foi brilhante. Particularmente me defino como um striker, mas meu nível de chão está a cada dia melhor. Tenho certeza que ele havia estudado o meu jogo e sabia que o meu forte era a trocação. Então, acho que o surpreendi ao encaixar a guilhotina”, disse Vuvuzela, que é faixa azul de Jiu-Jitsu.
Vuzuela começou a treinar apenas em 2010. Logo após se envolver em uma briga, um amigo separou a confusão e o convidou para treinar Muay Thai em um projeto social na Rocinha. E o talento para a luta logo ficou evidente. Em apenas três meses de treino ele se tornou campeão Estadual de Muay Thai e a paixão pela luta só foi aumentando.
“Eu dava muita dor de cabeça para a minha mãe na infância. Eu sempre estava metido em alguma confusão, pois eu era muito “brigão”. Quando eu já era adolescente, um amigo, que já lutava Muay Thai, separou uma briga em que eu estava envolvido e me chamou no canto para dizer que eu tinha muito talento para a luta e que estava desperdiçando brigando na rua. Foi aí que ele me convidou para treinar no projeto social que tem na Rocinha, o “Lutando para Crescer”. Eu aceitei e rapidamente comecei a ganhar títulos. Fui me envolvendo cada vez mais com o esporte, e para o MMA foi um pulo”, relembrou o lutador.
Chegada na BTT e estreia no MMA profissional
Quatro anos após começar a treinar Muay Thai, Vuvuzela passou a se interessar pelo MMA. No caminho, ele passou por algumas equipes, venceu algumas lutas no MMA amador, e ainda teve a oportunidade de viajar para a Tailândia, onde disputou, em 2016, o mundial da World Muay Thai Organization (WMO). A grande virada na carreira aconteceu em 2017, quando Vuvuzela chegou a Brazilian Top Team, equipe liderada pelo mestre Murilo Bustamante, primeiro brasileiro campeão do UFC e responsável por lapidar dezenas de lutadores de MMA.
“Tentava migrar definitivamente para o MMA desde 2014. Passei por algumas equipes, tive ajuda do meu mestre de Muay Thai Diego Buchecha, que decidiu tirar do próprio bolso para pagar um professor de Luta Livre para treinar a minha parte de chão. Consegui fazer quatro lutas no MMA amador, e venci todas. Mas, infelizmente, não durou muito tempo. Fui para a Tailândia disputar o Mundial e na volta fiquei sabendo que um amigo estava treinando na BTT. Ele me passou o telefone do mestre Ricardo Oliveira, que é o treinador de Muay Thai da equipe, e fiz contato pedindo uma chance. No dia seguinte fui lá, fiz um treino e ele me aprovou na equipe”, relembrou Vuvuzela.
Na BTT, Vuvuzela passou a se dedicar bastante ao Jiu-Jitsu e venceu por finalização, ainda em 2017, mais duas lutas no MMA amador. Em 2018, quando já se preparava para lutar no profissional, Vuvuzela enfrentou mais algumas dificuldades no caminho. Além de ter lutas canceladas, ele acabou sofrendo um lesão. A pedido do treinador Vitor Pimenta, ele acabou fazendo mais uma luta de MMA amador no final de 2018 – vencendo novamente por finalização. A tão aguardada estreia só aconteceu este ano, mas ele já engatou três lutas, vencendo todas elas também por finalização.
“O ano passado foi um período complicado. Fiquei 8 meses parado por conta de uma lesão e quando tive lutas marcadas, elas caíram. Então, o professor Vitor Pimenta me pediu para fazer mais uma luta no amador para que eu entrasse no ritmo antes da estreia profissional. Finalmente este ano eu consegui fazer a minha tão sonhada estreia no MMA profissional. Consegui fazer três lutas e vencer todas. Vou seguindo a minha jornada com muita dedicação e com Deus no coração, pois o meu maior sonho é chegar ao UFC, ou assinar com algum evento grande para que eu possa viver só da luta. Não procuro na luta uma vida de grana ou luxo, tudo o que eu quero é poder comprar uma casa para a minha mãe e ter uma estabilidade financeira para que eu possa investir nos estudos e no futuro da minha filha. Isso pra mim seria o suficiente”, concluiu o casca-grossa.