Wanderlei Silva, Pelé Landi, Johil de Oliveira, Carlão Barreto, The Pedro, Milton Bahia, Nilson de Castro, Alexandre Baixinho, Claudionor Fontinelle, Haroldo Bunn e Flávio Moura. Com tantos talentos reunidos o promotor do IVC, Sergio Batarelli, sabia que poderia tranquilamente produzir dois eventos em um. Assim foi o IVC Double Impact, realizado em Maceio no dia 28 de abril de 1999. Para quem comprava fitas cassetes em locadoras nos anos 90, este evento deu origem a duas: O IVC 10 com 4 super lutas (Wanderlei Silva x Eugene Jackson, Carlão Barreto x The Pedro, Milton Bahia x Haroldo Bunn e Silvio Urutum x Augusto Menezes). Já a fita do IVC 11 continha a revanche entre Pelé e Johil, além das 8 lutas do torneio até 80kg. Quem se deu bem foram os 8 mil pagantes que lotaram o ginásio do Sesi para assistir a esta verdadeira maratona de Vale-Tudo.
Adeus ao Brasil com dois nocautes em 9 dias
Que lutador marcaria uma luta num evento nacional sabendo que dali a nove dias faria sua estreia no UFC ? Só pra aumentar ainda mais o sarrafo, a luta em casa valia cinturão e era contra o americano Eugene Jackson, que vinha de uma sequência de 7 vitórias. Para completar, a beira do ringue estava o matchmaker do UFC, John Perreti, que já havia combinado com Batarelli que seu campeão estrearia no UFC (20) dali a nove dias. Obviamente, caso vencesse e não se machucasse.
Mas em tempos de vacas magras este tipo de responsabilidade só tinha um efeito sobre Wanderlei Silva: o aumento exponencial da agressividade. O curitibano precisou de exatos 32 segundos para tratorizar o americano, levando a galera a loucura. Na comemoração Wanderlei ergueu a bandeira do Brasil e me garantiu a capa da Tatame (#43) daquela edição. Capa esta que ele sempre faz confusão que foi sua primeira. Na realidade foi a primeira solo. Afinal, oito meses antes, o chute boxer já havia dividido uma capa (#34) da Tatame com Ebenezer Braga, quando ambos roubaram a cena atropelando wrestlers americanos no IVC 6.
E por falar em wrestler americano, Wanderlei não decepcionou John Perreti na sua estréia no UFC, dali a 9 dias, nocauteando Tony Petarra em 2min53s em sua estreia internacional. Quatro meses mais tarde o Silva faria sua estreia no Pride, iniciando o maior reinado de um peso médio (até 93kg) durante a década em que existiu o evento japonês.
Carlão Barreto vence The Pedro e quase agride Matchmaker do UFC
Numa das super lutas mais aguardadas da noite Carlão Barreto deu uma verdadeira aula de chão ao representante da Budokan, The Pedro. O faixa preta da Carlson Team derrubou, passou pegou as costas e, após uma saraivada de socos, obrigou The Pedro a desistir a 6min19s. A luta foi tão fácil que o matchmaker do UFC John Perreti disse a Carlão que a luta havia sido uma marmelada quando o faixa preta de carlson foi cumprimenta-lo . “Fuck You” respondeu o brasileiro sendo seguro por Sergio Baterelli. “Graças a este IVC, o Carlão nunca mais pisara no UFC”, me disse Perreti depois do episódio.
Na edição No65 do Papo de Luta, Barreto explicou em detalhes este desentendimento, revelando que seu problema com Perreti havia começado no UFC Brasil (17.5), onde Carlão fez sua primeira participação como comentarista para o SporTv e, aproveitando a presença de Perreti nos bastidores pediu que Mario Yamasaki traduzisse um pedido seu ao matchmaker americano. “Eu só tinha lutado uma vez no torneio do UFC 15 e fui pedir uma oportunidade a ele de voltar ao evento, com a ajuda do Yamasaki e ele me humilhou. Eu só não agredi ele ali, porque o Mario intercedeu. Na sequência ainda tentou mexer os pauzinhos para me expulsar da arena. Só voltou atrás quando viu que eu estava com o crachá da televisão. Depois disso tudo o cara ainda foi me chamar de marmeleiro depois de eu vencer o The Pedro. Foi difícil aguentar tamanho desrespeito e não dar uma porrada nele. Foi nesse dia que ele disse que enquanto ele estivesse no UFC eu não pisaria mais lá”, explicou Carlão esclarecendo onde tudo havia começado.
Johil x Pelé 2: a luta que começou no aeroporto
Não era segredo pra ninguém que Pelé não havia digerido a derrota para Johil na semifinal do WVC 4, quando foi desfigurado pelo carioca com centenas de cabeçadas em 30 minutos de combate, o que ninguém esperava é que os dois se pegassem em pleno aeroporto. Foi o que aconteceu no desembarque do vôo que levou toda a delegação para Maceio. Graças a autoridade dos mestres Rudimar e João Ricardo a luta acabou só ocorrendo mesmo no ringue.
Ao contrário do primeiro confronto, quando vinha de 9 minutos de guerra com Macaco na abertura do torneio, dessa vez Pelé chegou bem mais preparado fisicamente e dominou as ações em pé. Nas duas únicas oportunidades em que o representante da Budokan conseguiu levar a luta para o solo, não foi tão eficaz nas cabeçadas como da primeira vez. Ao término de 30 minutos os juízes decretaram a vitória unanime de Pelé que levou para Curitiba o cinturão até 80kg do principal evento do MMA nacional. Nove meses depois desta luta Pelé mostraria ao mundo porque vinha sendo apontado como No1 do mundo até 80kg, vencendo o campeão do UFC Pat Miletich por nocaute técnico nos Estados Unidos e faturando o cinturão do WEF.
Outro representante da Chute Boxe que se destacou no IVC 10 foi Silvio Urutum. Três meses após ser derrotado por The Pedro no IVC 9, o capoeirista mostrou porque fazia parte do time A da Chute Boxe ao derrotar o duro sergipano Augusto Monstro com socos da montada a 8min25.
Na outra super luta, o striker Milton Bahia não deu chances ao experiente faixa preta Haroldo “Cabelinho” Bunn. O aluno de Alexandre Paiva até começou bem levando o oponente ao chão em duas oportunidades, mas o escorregadio Bahia caiu para fora do ringue em ambas e a luta teve que ser reiniciada de pé. Na terceira tentativa, Milton bloqueou Cabelinho e, após acertar um cruzado, levou-o para o chão. Para vencer a excelente guarda de Cabelinho, o goiano passou a acertar seus temidos pisões por cima da guarda, os quais batizou de “Tas Bahia”. Na primeira tentativa Haroldo ainda tentou a chave de pé, só que depois não conseguiu mais bloquear os golpes, que acabaram quebrando sua costela, obrigando-o a desistir. Com esta vitória, Bahia passou a ser um dos mais temidos lutadores da divisão com 4 vitórias em 5 lutas. Sua única derrota havia sido exatamente para o campeão da categoria, Pelé Landi, que o nocauteou na final do IVC 5
A luta mais sangrenta da história
Para quem testemunhou as primeiras edições do IVC e WVC, marcadas por torneios de 3 lutas na mesma noite onde valia tudo e os atletas não usavam luvas, fica muito difícil cravar qual foi a luta mais sangrenta já realizada. Até o IVC 5 a disputa era parelha entre a final do IVC 2 (Wanderlei e Artur Mariano) e a semifinal do IVC 5 (Pelé vs Jorge Pereira). Mas a luta final do IVC 11 (Nilson de Castro vs Flavio Moura) acabou com todas as duvidas. Na sequencia vou explicar porquê.
O torneio começou com o veterano Claudionor Fontinelle nocauteando André Fernandes da Budokan. Na comemoração o maranhense levantou os 8 mil presentes ensaiando passos de breakdance , terminando performance com um bonito mortal
Neste mesmo lado da chave Flávio Moura da Budokan dizimou em menos de 2 minutos o único gringo no torneio. Doug Evans. Depois de ser levado ao chão pelo wrestler americano, Flavio conseguiu levantar botando o gringo pra baixo na marra, obrigando Batarelli a interromper a luta após aplicar uma sequencia de socos da guarda.
Na semifinal, como Lucas e Fontenelle quebraram as mãos em seus combates, Batarelli foi obrigado a tirar um lutador local da cartola para enfrentar Flavio, o kickboxer Carlos Lopes que não foi páreo para o atleta da Budokan. Moura derrubou pegou as costas e, após uma chuva de cotoveladas aplicou um mata-leão obrigando Carlos a bater em 1min57.
Queda de protetor define semifinal entre Chute Boxe e Ruas
Enquanto isso a outro chave começava com uma batalha de 20 minutos entre duas das principais escolas de striking do Brasil: o Ruas Vale-Tudo, de Alexandre Baixinho Barros, e a Chute Boxe, de Nilson de Castro. A luta foi uma guerra com Nilson levando vantagem em pé e Baixinho equilibrando com quedas . Perto de 15 minutos, o curitibano começou a dar sinais de cansaço . Mas quando as coisas pareciam melhorar para o carioca, ele deixou o seu protetor cair. Como, segundo as regras, ele não poderia recolocá-lo, Baixinho acabou perdendo um dente, na sequência, em mais um violenta troca de golpes. A partir daí o representante do Ruas VT passou a sangrar abundantemente, obrigando os médicos a interromperem a 19min31s. “Se os médicos não parassem o Alexandre iria até o final. Tem que ter uma revanche no próximo” me disse Rizzo assim que Baixinho desceu do ringue. Quatro meses após esta histórica guerra na estreia, Baixinho voltaria ao IVC vencendo três lutas numa noite e faturando o IVC 13
Nilsão chegou a semifinal contra o parceiro de Milton Bahia, Gilberto “Yorubá” Santos, com um profundo corte no supercilio. Gilberto aproveitou o alvo para aumentar o corte com um cruzado, levando o curitibano ao solo na sequencia, quando conseguiu abrir mais um corte com uma cotoveladas. Mas o aluno de Rudimar conseguiu voltar a luta em pé, definindo sua vaga na final com uma sequencia de socos, decretando o nocaute do cearense a 4min25s com uma joelhada.
Luta Final com dois cortes profundos
Depois de duas guerras contra Alexandre Baixinho (19m31s) e Gilberto Santos (4min25), Nilsão chegou à final com 2 enormes cortes. Nas regras atuais das Comissões Atléticas ele não passaria nem perto de um evento nos próximos seis meses. Mas não no IVC, onde a honra vinha a frente de tudo e a necessidade de reforçar a equipe Chute Boxe como nova potência do MMA levava estes lutadores a ultrapassarem todos os limites.
Mesmo muito avariado, Nilsão começou a final em vantagem, ao derrubar Flávio e atacá-lo com socos da guarda. Nesta hora, porém, seus 2 enormes cortes abriram e o sangue começou a jorrar em cima do oponente. A esta altura, fotógrafos, corners e todos a volta do ringue já estavam chapiscados de sangue. O fluxo era tanto, que obrigava Moura a fechar os dois olhos. Diante desta cena dantesca, os médicos finalmente resolveram interromper para examinar o atleta. Decretar o fim da luta parecia o óbvio, correto ? Não no IVC. Diante dos pedidos de Rudimar e Nilsão os médicos, inacreditavelmente, decidiram autorizar a continuação da luta . Após breve trocação, Flávio partiu para o clinche e derrubou Nilsão. Com os potentes ataques de dentro da guarda, os dois rombos de Nilson começaram a sangrar abundantemente e os médicos decidiram interromper a 4min38s. Flavio Luiz Moura se sagrava campeão do torneio mais sangrento da história dos esportes de combate.