De um lado o brasileiro, único lutador na história a conquistar quatro cinturões peso-pesado de eventos diferentes (WEF, RINGS, PRIDE e UFC), do outro o veterano americano, único a conquistar quatro cinturões do UFC em duas categorias diferentes, lutando em casa diante de uma torcida de 14 mil pessoas. Curiosamente as duas lendas vinham de revezes. Minotauro havia acabado de perder o cinturão interino para Frank Mir, enquanto Couture havia perdido o linear para Brock Lesnar. A vitória poderia definir o próximo oponente de Lesnar.
Para completar este card histórico do UFC 102, realizado há 15 anos, no dia 29 de agosto de 2009, na Rose Garden Arena em Portland, mais quatro clássicos entre representantes das duas maiores potenciais do esporte: Demian Maia Vs Nate Marquadt, Gabriel Napão Vs Chris Tuschcherer, Thiago Silva Vs Keith Jardine e Marcus Aurelio Vs Evan Dunham.
Texto e Fotos Marcelo Alonso
Depois da derrota para Frank Mir (UFC 92), que lhe valeu a perda do cinturão interino dos pesados, Rodrigo percebeu naquele momento que precisava fazer uma mudança radical em sua vida. Foi então que, há três meses, decidiu se mudar para os Estados Unidos e, longe dos problemas e tentações da rotina no Rio de Janeiro, se preparar de verdade para enfrentar um dos maiores desafios de sua carreira: derrotar o rei do octagon em casa. Talvez motivado pela péssima atuação de Rodrigo na última luta, Couture tenha chegado muito autoconfiante, exibindo até um certo sorriso irônico na conferência de imprensa. Mau negócio. A postura de Randy pareceu mexer mais ainda com os brios do ex-campeão do Pride. Na manhã da luta, Rodrigo andava de um lado para o outro no quarto dos treinadores, Luiz Alves e Luiz Dórea. “Nunca vi o Rodrigo tão focado. Ele sabe que esta é a luta da vida dele”, revelava Alves a poucas horas do evento, prontamente apoiado pelo parceiro de quarto, Dórea: “o Rodrigo passou três meses internado, só treinando, pode apostar numa vitória”.
No octagon, nem mesmo os quase 14 mil presentes no Rose Garden Arena foram suficiente para vencer a obstinação do baiano de 33 anos, que já foi atropelado por um caminhão aos 11 e conseguiu dar a volta por cima e se consagrar nos ringues de MMA, vencendo gigantes como Bob Sapp e Cro Cop. O combate não poderia ser mais emocionante. Randy sabia que não seria um bom negócio levar o campeão de Jiu-Jitsu para o solo e veio preparado para decidir a luta em pé, vindo com tudo para cima do baiano. Mas com o Boxe afiado, e um poder de absorção acima da média, Rodrigo conseguiu resistir aos bons golpes encaixados pelo veterano de 46 anos nos minutos iniciais e virar a luta levando o wrestler americano para o solo com dois knock downs, que definiram os dois rounds iniciais. Com o wrestler de costas no chão, o campeão de Jiu-Jitsu passeou e chegou perto de finalizá-lo em três oportunidades, mas com o apoio da torcida, Couture se superava e conseguia voltar em pé. O último minuto do terceiro assalto foi um retrato do combate. Minotauro nas costas de Couture tentando estrangulá-lo, o americano conseguindo escapar, caindo na guarda do brasileiro e acertando alguns golpes perigosos. Quando a torcida já começava a gritar, comemorando o que parecia uma reação, Rodrigo raspa e cai montado, até o gongo soar, decretando o fim dos 15 minutos de um combate que, segundo o próprio promotor, Dana White, entrou para a história como um dos melhores destes 16 anos de UFC.
Outros quatro brasileiros lutaram neste mesmo card. Gabriel Napão e Thiago Silva venceram, mas Demian Maia e Marcus Aurélio foram derrotados.
Invicto com 11 vitórias no MMA, Demian vinha de cinco vitórias no UFC, sendo a ultima uma finalização sobre Chael Sonnen no UFC 95. Contra Marquardt, porém, Demian cometeu um erro no primeiro minuto de luta, ao tentar um low kick, que foi prontamente aproveitado pelo americano, que definiu a luta com um direto de direita.
Reestreando no UFC, Marcus Aurélio travou uma guerra com Evan Dunham, na qual acabou perdendo na decisão. Já Thiago Silva e Gabriel Napão não deixaram nas mãos dos juízes. Napão atropelou o parceiro de treinos de Brock Lesnar, Chris Tuschcherer em 2min27s, já Thiago Silva, que havia perdido sua invencibilidade de 13 lutas para Lyoto Machida, sete meses antes, na luta que definiu quem lutaria com Rashad Evan pelo cinturão, voltou ao octogono atropelando Keith Jardine em 1min35s. As vitórias de Napão, Thiago e Minotauro garantindo uma vitória de virada para o Brasil (3 x 2) nos cinco clássicos contra os americanos que mercaram este UFC 102. Ao final do evento Marcelo Alonso bateu um papo com Minotauro ainda no vestiário.
COMO FOI VENCER O COUTURE EM CASA E COM TODA ESTA PRESSÃO ? Foi um lutão ! e o Couture só valorizou a minha vitória. Ele escapou de todas as minha tentativas de finalização e veio pra cima o tempo inteiro. Ele tentou fazer o jogo dele na grade, mas treinei muito com o Mark Muñoz e outros grandes wrestlers que me deixaram bem na greco romana.
NO PRIMEIRO ROUND, VOCÊ APLICOU UM KNOCK DOWN E TENTOU FINALIZAR COM UM TRIÂNGULO DE MÃO. FICOU SURPRESO QUE ELE TENHA RESISTIDO? Estava bem encaixado, mas estava escorregando um pouco, porque o pessoal do UFC passa vaselina demais no rosto e isso me atrapalhou um pouco. Quando eu passei a mão por debaixo do rosto dele, estava difícil de pegar no biceps, não estava conseguindo pegar direito. Na parte de trocação, o Dórea veio pra cá um mês e meio antes e isso foi muito importante pra afiar meu boxe. Treinei também com o Cigano e com o Anderson, e consegui pegar uma distância boa. No começo estava um pouco difícil, mas achei a minha distância e consegui aplicar bons diretos. Senti que o Randy cantou a pedra. Eu ia jogar o jab, Ele esquivava. Mas é por isso que nunca apliquei um golpe só, sempre em sequência, ai derrubei ele.
O QUE VOCÊ ACHOU DE ENTRAR VAIADO NA LUTA E SAIR APLAUDIDO? Porra, os caubóis me ajudaram, me deixaram com muita raiva e centrado (risos). Eu vi que era aquele gostinho, tinha que estar pronto e preparado. Antes da luta, a gente fez bastante ginástica natural com o Álvaro Romano e bastante respiração e mentalização, controlando isso. “Você está entrando no ginásio, ele está te vaiando… Respira fundo, normaliza a respiração”. Eu fui me preparando para aquela situação, e, graças a Deus, deu certo. Quando eu entrei ali e recebi a vaia, isso não me surpreendeu em nada. Eu sabia que seria assim. Graças a Deus saímos da luta e eu peguei o microfone, falei que foi uma honra lutar com o Randy Couture, que ele sempre foi um dos meus ídolos. Desde 1997 eu acompanho a carreira dele e foi uma honra ele ter aceitado lutar comigo. O próprio adversário me fez treinar tanto e, quando eu falei isso, o público adorou. Eles gostaram da minha apresentação e eu não deixei de enaltecer o cara, que é um ídolo aqui nos Estados Unidos.
O RANDY É UM DOS MAIORES NOMES DO UFC, E NUNCA TINHA PERDIDO UMA LUTA POR DECISÃO. VOCÊ TINHA ESSE RECEIO, DE TERMINAR A LUTA ANTES E EVITAR A DECISÃO DOS JUÍZES? Tentei finalizar, tentei o katagatame, mata-leão nas costas, tentei triângulo de mão três vezes… Tentei no nocaute, quando conectava os golpes ele mostrou que tem queixo e resistência. Ele é o Randy Couture, não tem nem o que falar. guerreiro, atleta olímpico, valorizou bastante a luta… A gente fez uma das melhores lutas do UFC. Foi um lutão.
O ANDERSON TE AJUDOU MUITO NOS TREINOS PARA ESSA LUTA. COMO FOI O APOIO DELE NOS TREINOS? Ele é uma peça fundamental. A gente estava treinando em San Diego, na academia do Brandon Vera e numa outra academia, estávamos com um camp bom, aí o Anderson passou lá com cinco carros… Ele, o Feijão, todo mundo. Eles me mandaram colocar tudo no carro e ir para Los Angeles. O último mês foi perfeito, me deram uma estrutura boa de treino. Treinei com ele todo dia e foi excelente.
VOCÊ JÁ ESPERA UMA CHANCE PELO CINTURÃO? A intenção é essa, vamos ver o que eles oferecem. O Lesnar luta em novembro, então estou esperando. Estou a fim de lutar.
COMO VOCÊ ACHA QUE SERIA UMA LUTA SUA CONTAR O BROCK? ACHA QUE SERIA PARECIDO COM A DO BOB SAPP? Acho que essa luta teria mais trocação. Estou melhor agora na trocação do que naquela época, estou mais experiente em pé. Seria uma luta com muita movimentação, se cair no chão não posso parar com aquele gigante em cima de mim, tenho que estar sempre fugindo o quadril para não deixar ele usar o peso em cima de mim e tentar a finalização. Uma hora a finalização vai sair, e vai ser um lutão.