IVC 5: Pelé vence Wrestling e Jiu-Jitsu e consagra Chute Boxe em noite sangrenta

0
818
na semifinal Pelé dominou Jorge Pereira e obrigou os juizes a interromperem a 8min15s devido a um forte sangramento

Considerado o evento de Vale-Tudo mais real já realizado na era moderna, o International Vale Tudo (IVC) organizado por Sérgio Batarelli tinha como marca registrada a realização de torneios históricos que tinham como principal atrativo, confrontos entre brasileiros e americanos ou duelos sangrentos entre os arqui-rivais da época: Muay Thai, Wrestling, Jiu-Jitsu e Luta-Livre (Budokan).

O fato é que das 13 edições do IVC realizadas por Sérgio Batarelli, nenhuma teve um torneio até 80kg tão equilibrado e sangrento quanto o IVC 5, realizado no dia 26 de abril de 1998 no auditório do hotel Meliá em São Paulo. Entre os brasileiros estavam nomes como Jorge Pereira (Jiu-Jitsu), Pelé Landi (Muay Thai), Johil de Oliveira (Luta-Livre), Milton Bahia, Eric Tavares e Carlos Indio. Entre os americanos, representantes do Wrestling, estavam  Darrel Gohlar, Brian Raynei, Gerald Taylor.

Com uma atuação de gala Pelé Landi (1,82m/80kg) venceu com sobras colocando o nome da Chute Boxe pela primeira vez em destaque no cenário nacional.

Nascido em Cuba e naturalizado brasileiro, Pelé abriu o evento dizimando o Wrestler americano Gerald Taylor (174m/80kg). Foram 13min34s de pau pereira onde Landi, mesmo tendo sido derrubado duas vezes, conseguiu levantar e impor seu jogo. Com saraivadas de socos, cotoveladas e joelhadas o cubano obrigou Batarelli a interromper o combate.

Na mesma chave o faixa preta de Jiu-Jitsu Jorge Pereira (1,80m/80kg) pegava o wrestler Brian Raynei (1,73m/77kg) campeão do Extreme Combat Challenge. O americano partiu com tudo para cima de Jorge derrubando o brasileiro em duas oportunidades. Mas o faixa preta usou sua guarda para cozinhar o americano, que aos 7 minutos já dava sinais de cansaço. Depois de algumas tentativas de raspagem, chaves de pé e ataques de braço, Brian permitiu que Jorge chegasse as suas costas e o brasileiro conseguiu a  finalização aos 11min 51s com uma mata-leão. 

JOHIL X GOHLAR: A LUTA DA NOITE    

As pedreiras do Wrestling que Pelé e Jorge pegaram não se comparavam a Darrel Gohlar. (1,74m/79kg), sem dúvida alguma o mais condecorado wrestler dos quatro trazidos por Batarelli para o show. Gohlar já tinha sido duas vezes vice campeão Pan americano, tendo conseguido algumas vitórias sobre ícones da Greco Romana como Randy  Couture e Dan Henderson. Mesmo aos 36 anos e fazendo sua estréia no Vale-Tudo, o americano mostrou a que veio logo nos primeiros segundos. Arremessando Johil ao solo com um plástico Double leg e iniciando seu poderoso ground and Pound, abrindo o supercílio do brasileiro.

Na sequência Johil conseguiu voltar em pé, onde teoricamente levaria vantagem sobre o americano, mas Darrel surpreendeu aceitando a troca franca . Aos 9 min30s quando Johil começava a conectar fortes chutes no joelho de Gohlar, o americano conseguiu acertar um direto no queixo do brasileiro, que caiu imediatamente fazendo guarda. Depois de mais alguns minutos de Ground and Pound, Johil mais uma vez mostrou sua raça levando o wrestler para a luta em pé novamente . A partir daí, o brasuca mesmo já estando todo ensanguentado passou a dominar inteiramente, com potentes chutes na altura do joelho e fortes socos , chegando a desequilibrar o oponente alguma vezes.

Depois de quase 20 minutos de desvantagem em pé, Darrel levou a luta para o chão encurralando-o no córner e passando os últimos 3 minutos da luta imprimindo seu Ground and Pound. 

Mas quando o negócio começava a ficar feio para Johil o gongo soou e os juízes por unanimidade decretaram a vitória do representante da Luta-Livre. “Nunca vi um cara tão forte.Venci os primeiros 20 minutos e ele os 10 últimos. Com a minha técnica e a força dele, eu venceria qualquer um no mundo”, me disse Johil comemorando muito com o mestre João Ricardo. Do outro lado Darrel parecia não acreditar na decisão dos juízes. “Ele saiu todo arrebentado e eu inteiro, quero uma nova luta, se ele quiser agora mesmo. Aceito lutar com qualquer brasileiro, mas primeiro quero o Johil”, me disse Darrel a época. Quatro anos mais tarde, em 2002, o faixa preta Marcos Vinícius de Lucia apresentaria Gohlar para Belfort e este o traria ao Brasil. Apaixonado pelo Rio de Janeiro Darrel veio morar na cidade onde iniciou uma verdadeira revolução após passar a ensinar Wrestling na BTT e Nova União, influenciando diretamente na evolução técnica de alguns dos principais representantes brasileiros no MMA mundial.     

Johil venceu Gohlar na decisão após uma guerra de 30 minutos

O GUERREIRO NÃO SANGRA TRANSBORDA DE HONRA

Depois que Pelé venceu o maior ícone do Jiu-Jitsu paulista, Jorge Macaco, duas vezes, a comunidade do Jiu-Jitsu aguardava ansiosa a oportunidade de um representante carioca da modalidade vingar o Jiu-Jitsu. Faixa preta de Rickson Gracie e com vitórias sobre Ebenezer Braga e Roberto Godói em dois outros torneios de Vale-Tudo até 93kg, Jorge Pereira decidiu aceitar o convite de Batarelli para lutar na categoria de baixo e dar a resposta ao trash talker da Chute Boxe que já se vendia como terror do Jiu-Jitsu.   

Quando o combate começou, Jorge clinchou rápido, mas na troca de esgrima acabou sendo colocado para baixo pelo cubano, que vinha treinando Jiu-Jitsu com Hélio Sonequinha e já se sentia confortável para lutar no chão. Num movimento surpreendente, Pelé pulou pelo meio da guarda de Jorge tentando acertá-lo com um pisão. “Boa” reconheceu o próprio Jorge na época. A partir daí Pelé passou a ironizar o oponente mandando beijos e estendendo a mão para ele levantar. Foi então que Jorge aceitou o convite e voltou a luta em pé. Mas não por muito tempo. Na troca de esgrima Pelé conseguiu acertá-lo com uma potente joelhada, abrindo um rombo em seu supercílio que jorrava sangue numa intensidade tal que obrigou os médicos a interromperem o combate a 8 min15s. “Quero continuar to inteirinho disse Jorge após a interrupção fazendo flexões e revoltado. “Um guerreiro não sangra, transborda de honra. Terei o maior prazer de terminar esta luta com o Pelé no IVC 6 ou num desafio a portas fechadas”, disse ao final o faixa preta. Enquanto Pelé voltava ao vestiário para se concentrar para a grande final. 

na semifinal Pelé dominou Jorge Pereira e obrigou os juizes a interromperem a 8min15s devido a um forte sangramento

PELÉ VENCE E DECRETA ERA CHUTE BOXE

Depois de 30 minutos de guerra com o Darrel Gohlar, Johil não teve condições de lutar na semifinal com Milton Bahia (1,78m/78kg), que havia vencido na primeira luta o sergipano Eric Tavares (1,80m/79kg). No lugar de Johil entrou seu companheiro de equipe Carlos Danilo (1,80m/77kg), que não suportou o volume de Milton. Na final entre strikers, o melhor chão do paranaense fez a diferença. Pelé caiu por cima e definiu a luta com socos de dentro da guarda, obrigando Bahia a pedir pra parar. Com as três vitórias por nocaute técnico sobre Taylor, Pereira e Bahia, o representante da Chute Boxe decretou que sua equipe chegaria para dominar o cenário.“Temos para todos o pesos. A partir de agora quem vai dominar o mundo é a Chute Boxe”, decretou em tom profético o primeiro atleta reconhecido nacionalmente formado por Rudimar Fedrigo. 

WALLID VENCE WRESTLER E DESAFIA PELÉ

Quatro meses depois da vitória sobre Johil, que lhe valeu o título de campeão do IVC até 80kg, Wallid (1,72m/85kg) voltou ao IVC para fazer a super luta do evento contra o wrestler Gary Myers, (1,74m/100Kg). Os dois pemaneceram quase toda a luta clinchados no córner trocando socos e tostões … Quando faltavam três minutos para o fim Wallid finalmente conseguiu derrubar o gringo. E quando estava quase chegando a montada o gongo soou e os jurados deram a vitória por 3 x0 para o brasileiro. Num momento em que os wrestlers começavam a dominar o cenário com vitórias sobre o Jiu-Jitsu, Wallid soube capitalizar: “Eu dedico esta vitória aos que diziam que eu não tinha técnica. Eu sou o vingador do Jiu-Jitsu, venci um campeão mundial de Wrestling, 15kg mais pesado. Meus adversários eu trato da mesma maneira deixo as asas crescerem e depois corto. O próximo da lista vai ser o Pelé que já está com as asas muito compridas para o meu gosto”.

Este seria o primeiro capítulo de uma longa rivalidade, que nunca foi resolvida nos ringues. A pedido de Pelé, Batarelli tentou casar a super luta no IVC 6, mas não houve acordo com relação as bolsas. Como dois dos mais bem sucedidos trash talkers da história do MMA nacional, Wallid e Pelé proporcionaram belas manchetes aos principais veículos da luta por quase seis anos. Até que Wallid se aposentou e já como promotor do Jungle, trouxe Pelé para protagonizar quatro edições seguidas de seu evento (JF3, JF4 , JF5, e JF6).